EMENTA: Ação para extinção de fundação privada. Sentença de improcedência. Recurso do Ministério Público. A fundação privada poderá ser extinguida somente nos casos enumerados no artigo 69 do Código Civil, cumulado com as disposições contidas no artigo 1.204 do Código de Processo Civil. No caso, em que pese a fundação tenha um número reduzido de associados e um único imóvel destinado a veraneio destes, não há, por enquanto, motivos suficientes à sua extinção. A manutenção de imóvel para veraneio dos seus associados é atividade que, por si só, já caracteriza o cumprimento dos seus objetivos estatutários, enquanto atividade de fins assistenciais e de lazer.
APELAÇÃO CÍVEL
VIGÉSIMA CÂMARA CÍVEL
Nº 70037688389
COMARCA DE PORTO ALEGRE
MINISTERIO PUBLICO
APELANTE
FUNDACAO CAUDURO DOS FUNCIONARIOS DE CAUDURO IRMAO E CIA LTDA
APELADO
ACÓRDÃO
Vistos, relatados e discutidos os autos.
Acordam os Desembargadores integrantes da Vigésima Câmara Cível do Tribunal de Justiça do Estado, à unanimidade, em negar provimento ao recurso de apelação.
Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, além do signatário, os eminentes Senhores DES. RUBEM DUARTE (PRESIDENTE) E DES.ª WALDA MARIA MELO PIERRO.
Porto Alegre, 22 de setembro de 2010.
DES. CARLOS CINI MARCHIONATTI,
Relator.
RELATÓRIO
DES. CARLOS CINI MARCHIONATTI (RELATOR)
Trata-se da denominada ação de extinção proposta pelo MINISTÉRIO PÚBLICO contra FUNDAÇÃO CAUDURO DOS FUNCIONÁRIOS DE CAUDURO IRMÃO E CIA LTDA.
O colendo juízo de origem julgou improcedente a demanda, assim (fls. 233-241):
Vistos etc.
O MINISTÉRIO PÚBLICO ingressou com AÇÃO ORDINÁRIA contra FUNDAÇÃO CAUDURO DOS FUNCIONÁRIOS DE CAUDURO E IRMÃO E CIA LTDA, alegando que a fundação ré não vem mais cumprindo com as finalidades previstas no estatuto que a instituiu, porquanto após a dissolução da empresa Cauduro Irmão Ltda., o número de beneficiários foi sendo reduzido, chegando a um número de dez. Além disso, o único bem que a entidade possui é um imóvel em Cidreira, utilizado como colônia de férias pelos associados. De outro lado, desde 2002 a ré não consegue a aprovação de suas contas, encontrando-se em situação atípica atualmente, sem qualquer atividade, mantido tão somente um imóvel para uso dos associados. Tendo em vista estes fatos, postula a extinção da fundação.
Citada, ofereceu a ré contestação, onde em resumo defendeu que a entidade vem cumprindo com a sua finalidade principal, que é a de conferir benefícios aos ex funcionários da empresa falida. Que não vem cumprindo com todas as suas finalidades, face a dificuldades financeiras e o número reduzido de membros, mas que mantém uma colônia de férias exclusivamente com a contribuição dos associados, inexistindo qualquer uma das hipóteses legais de extinção. Requereu improcedência.
Após outras manifestações, foi realizada audiência de instrução.
É O RELATO.
PASSO A DECIDIR.
Pretende o Ministério Público a decretação de extinção da fundação ré, sob o argumento principal de que ela não estaria mais cumprindo com as finalidades para as quais foi criada.
A pretensão não merece acolhimento.
O Estatuto da Fundação, em seu artigo 1º, positivou quais seriam os objetivos da entidade, ou seja, "complementarmente aos ex empregados da firma em falência da Instituidora, habitacional, práticas desportivas, recreativas e culturais e outros benefícios, como serviço social, pecúlios, auxílios diversos".
Já o artigo 3º do mesmo Estatuto elencou, dentre outros, o serviço de colônia de férias que deveria ser prestado aos beneficiários.
O objetivo dos instituidores era claro, ou seja, proporcionar aos ex empregados da empresa falida alguma espécie de auxílio, seja pecuniária, recreativa ou cultural.
É certo que atualmente nem todas estas finalidades vêm sendo cumpridas pela entidade, especialmente as pecuniárias (auxílios, pecúlios, etc), pela redução natural do numero de membros, acarretando inexorável e proporcional redução dos recursos que para estas finalidades poderiam ser destinados.
Todavia, apesar de não mais conseguir atingir todos os seus objetivos, tem conseguido a ré manter em boas condições o imóvel localizado em Cidreira, proporcionando aos seus membros e familiares o uso regular nas férias, com o que mantida e atingida, mesmo que de forma incipiente, a finalidade recreativa para qual foi criada.
Note-se que a vontade subjacente do instituidor era a de proporcionar bem estar aos ex funcionários da empresa, o que de certa forma, mesmo que exclusivamente através do imóvel praiano, tem se conseguido.
A prova oral produzida em audiência positivou a importância do imóvel para os associados, mantido e utilizado por eles e seus familiares nas férias de verão, chegando a ser afirmado que sem a colônia de férias sequer teriam condições de aproveitar o veraneio na praia (conferir os depoimentos de fls. 227/229).
Além disso, positivaram as boas condições de conservação do local e que uma vez por ano são convocados para analisar as contas relativas aos gastos com o imóvel, desconhecendo qualquer reclamação de quem quer que seja.
O artigo 1204 do Código Civil autoriza a extinção somente quando a fundação se torna ilícita, impossível ou inútil a sua finalidade, ou vencido o prazo de sua existência.
No caso em exame, e conforme acima explanado, nenhuma dessas hipóteses se verifica, porquanto a finalidade não é ilícita, nem impossível e muito menos inútil para os seus membros, face a necessidade de utilização do imóvel para as férias de seus familiares.
De outro lado, a manutenção da Fundação, mesmo que com a pequena atividade hoje existente, não trará qualquer prejuízo ao Poder Público ou a terceiros, não havendo razão para a medida drástica postulada pelo MP, que ao revés, somente atingiria aqueles que justamente os instituidores visavam proteger, pouco importando se atualmente são poucos.
Pelo exposto, JULGO IMPROCEDENTE o pedido inicial. Condeno o autor no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios, que pela natureza da causa e trabalho desenvolvido fixo em R$ 1.500,00.
O recurso de apelação do Ministério Público (fls. 233-241) reitera a pretensão inicial de extinção da fundação demandada, face ao descumprimento dos seus objetivos estatutários, bem como pela ausência de aprovação das suas contas desde o ano de 2002.
O recurso foi recebido (fl. 243, verso) e contra-arrazoado (fls. 244-248).
As contra-razões propugnam pela confirmação da sentença.
Os autos vieram ao Tribunal de Justiça, dando-se vista à ilustre Procuradora de Justiça, que opinou pelo provimento do recurso de apelação (fls. 251-252).
Os autos vieram conclusos em 27.8.2010, ocasião em que relatei e minutei o projeto de voto à douta revisão e à espera do julgamento da Câmara conforme a escala e vencido o período das minhas férias regulamentares em agosto.
É o relatório.
VOTOS
DES. CARLOS CINI MARCHIONATTI (RELATOR)
Antecipo a conclusão do meu voto no sentido de confirmar a respeitável sentença por seus próprios e jurídicos fundamentos, propositadamente transcritos no relatório para se integrarem ao meu voto como razões de decidir.
Durante a sessão, ouvi com muita atenção a sustentação oral do procurador da parte demandada e o parecer do Procurador de Justiça, ambas feitas com muito critério e chamando atenção às circunstâncias mais relevantes.
De acordo com isso e com a sentença, a fundação privada poderá ser extinguida somente nos casos enumerados no artigo 69 do Código Civil, cumulado com as disposições contidas no artigo 1.204 do Código de Processo Civil.
No caso, em que pese a fundação tenha um número reduzido de associados e um único imóvel destinado a veraneio destes, não há, por enquanto, motivos suficientes à sua extinção.
Nem mesmo a alegada desaprovação das contas nos autos de 2002 a 2006 é motivo suficiente a sua extinção, isso porque, ao que consta dos autos, a desaprovação se deu porque entendeu-se que a entidade estava "impossibilitada de cumprir seus objetivos estatutários", conforme parecer da Unidade de Assessoramento Contábil do Ministério Público (fl. 73).
A manutenção de imóvel para veraneio dos seus associados é atividade que, por si só, já caracteriza o cumprimento dos seus objetivos estatutários, enquanto atividade de fins assistenciais e de lazer, principalmente se considerarmos que na hipótese da suas extinção, o imóvel deverá ser destinado à outra fundação que se proponha a fim igual ou semelhante, como prevê na escritura pública que a instituiu (fl. 12-15) e no artigo 63 do Código Civil.
Implica dizer que esta finalidade, conforme a instituição da fundação, realiza-se plenamente, ainda que as demais finalidades não, e, persistindo, é relevante e descaracteriza a extinção.
É de se indagar também, que efeito ou resultado teria a extinção, em situação que ou destinar-se-ia o imóvel a outra entidade análoga ou reverteria ao instituidor, hoje falido.
Salvo melhor juízo dos Colegas, prefere-se a situação atual, até que outro fato se sobreponha.
Face ao exposto, nego provimento ao recurso de apelação, confirmando a respeitável sentença por seus próprios e jurídicos fundamentos.
DES.ª WALDA MARIA MELO PIERRO (REVISORA) - De acordo com o(a) Relator(a).
DES. RUBEM DUARTE (PRESIDENTE) - De acordo com o(a) Relator(a).
DES. RUBEM DUARTE - Presidente - Apelação Cível nº 70037688389, Comarca de Porto Alegre: "NEGARAM PROVIMENTO AO RECURSO DE APELAÇÃO. UNÂNIME."
Juiz de Direito da sentença: Dr. Murilo Magalhães Castro Filho.
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Conforme a NBR 6023:2000 da Associacao Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), este texto cientifico publicado em periódico eletrônico deve ser citado da seguinte forma: BRASIL, STJ - Superior Tribunal de Justiça. TJRS - Civil e Processo Civil. Ação para extinção de fundação privada. Sentença de improcedência. Recurso do Ministério Público. A fundação privada poderá ser extinguida somente nos casos enumerados no artigo 69 do Código Civil Conteudo Juridico, Brasilia-DF: 10 jun 2013, 08:00. Disponivel em: https://conteudojuridico.com.br/consulta/Jurisprudências /35469/tjrs-civil-e-processo-civil-acao-para-extincao-de-fundacao-privada-sentenca-de-improcedencia-recurso-do-ministerio-publico-a-fundacao-privada-podera-ser-extinguida-somente-nos-casos-enumerados-no-artigo-69-do-codigo-civil. Acesso em: 23 nov 2024.
Por: TJSP - Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo
Por: TRF3 - Tribunal Regional Federal da Terceira Região
Por: TJSC - Tribunal de Justiça de Santa Catarina Brasil
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